Galípolo: “Estratégia do governo foi trazer o debate à luz do sol”

Diretor de Política Monetária do Banco Central falou sobre a redução da taxa básica de juros. Para o economista, discutir alternativas de forma transparente contribuiu para a melhora do ambiente macroeconômico

 

Como parte das comemorações do Dia do Economista, celebrado em 13 de agosto, o Cofecon realizou nesta terça-feira (15) um debate com o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo. O tema foi a redução da taxa de juros. Participaram também os conselheiros federais Antonio Corrêa de Lacerda e Fernando de Aquino, além de jornalistas de vários veículos de comunicação.

Galípolo explicou que mesmo antes da reunião do Copom, já havia na curva de juros futuros uma redução superior a 400 pontos base e que isso se devia a uma melhora no ambiente econômico desde o início da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva. “As medidas iniciais buscavam justamente fazer um enfrentamento da questão das contas públicas, tanto do ponto de vista da arrecadação quanto do gasto, mas governado pelo espírito democrático de entender qual a regressividade, a eficiência e o resultado de qualquer tipo de esforço fiscal colocado”, argumentou o economista.

“Naquele momento o pacote foi recebido com um legítimo grau de ceticismo, porque o caminho para enfrentar questões que impactam o conflito distributivo é realmente difícil”, pontuou o diretor do BC. “A estratégia do governo foi trazer o debate à luz do sol, deixando claros quais são os impactos da medida e os interesses efetivamente envolvidos. A intenção era menos que os economistas impusessem algum tipo de caminho à sociedade, e mais de escutar a sociedade e o resultado das urnas, apresentando alternativas e explicando as implicações e consequências de cada uma das escolhas”.

No momento, há uma pressão externa vinda dos preços dos títulos norte-americanos. “Eles estão sendo influenciados por diversas variáveis e os analistas dão peso maior ou menor a cada uma delas. Alguns apontam uma crescente necessidade do financiamento, por um déficit maior, alterando o valor dos títulos e aumentando as taxas; simultaneamente, há uma redução da demanda por compradores tradicionais dos títulos; há o aperto no próprio balanço do Federal Reserve”, explicou o economista. “Essas variáveis têm provocado algum tipo de perturbação nas taxas de juros norte-americanas, o que tem gerado volatilidade nas últimas semanas”.

A elevação dos juros dos Estados Unidos, no entanto, ainda não provocou a desaceleração esperada. E o próprio momento econômico – após o quantitative easing, a pandemia de Covid-19 e a guerra na Ucrânia – trazem mais complexidade para a análise. “Aqui no Brasil nós sabemos que a elevação das taxas de juros mais longas nos Estados Unidos provoca efeitos que demandam cuidado nos países emergentes. Mas o Brasil hoje tem uma boa aceitação no cenário internacional por uma série de questões, muitas delas estruturais”, analisou Galípolo. “Temos um volume elevado de reservas internacionais, uma herança positiva dos governos anteriores do presidente Lula, o que difere da situação de outros países emergentes que, com a reversão do cenário de liquidez abundante, voltaram a apresentar problemas que nós conhecíamos bem ao longo do Século 20”.

Olhando para o futuro, o economista vê o Brasil com a possibilidade de ser protagonista no cenário da transição ecológica. “Temos uma democracia bastante consagrada, o que nos ajuda a atrair investimentos. Estes cenários que estamos assistindo, com a volta do mercado de capitais, estão muito associados aos resultados colhidos pela melhora no ambiente econômico. Vamos organizar os dados passo a passo para entrar num ciclo virtuoso de inflação controlada, desenvolvimento econômico com inclusão social e sustentabilidade ambiental”, finalizou Galípolo. A fala do diretor do Banco Central pode ser assistida AQUI

O conselheiro federal Antonio Corrêa de Lacerda comentou o período pós-crise de 2008, quando as principais taxas de juros ao redor do mundo estiveram, por um longo período, muito próximas de zero. Apontou para o fato de que a dívida pública no Brasil tem um custo de financiamento muito superior ao dos demais países. Ao discutir a inflação brasileira, destacou que existem fatores de oferta que não são diretamente influenciáveis pela taxa de juros: “Há fatores exógenos, como o preço das commodities no mercado internacional. Além disso, no Brasil temos um mercado em grande parte oligopolizado, e o poder de formação de preços exige medidas que vão além daquelas do Banco Central ou da própria meta de inflação”, argumentou. Lacerda também apontou que o boletim Focus, que capta as expectativas de mercado, deveria ouvir economistas de outras áreas que não apenas o mercado financeiro: “A própria visão de autonomia do Banco Central precisa ser melhor explicada para a sociedade”. A fala dele pode ser assistida AQUI

O conselheiro Fernando de Aquino trouxe ao debate algumas questões operacionais. “Há um excesso de operações compromissadas, que há dez anos giram em torno de 15% do PIB. Hoje temos uma alternativa com o mesmo rendimento, que são os depósitos voluntários remunerados. Outra questão seria ter políticas que aumentassem a influência na determinação da curva de juros”, afirmou Aquino. “Essas políticas permitiriam a prática de taxas de juros menores com o mesmo efeito sobre o nível de atividade e a inflação, porque reduziriam a volatilidade da curva”. A participação do conselheiro federal pode ser assistida AQUI.

“Há algumas discussões que eu gostaria de fazer com técnicos do Banco Central, sejam da diretoria de Política Monetária ou das demais áreas. Ali há uma quantidade enorme de informações, algo que não deveria ficar restrito e que vale a pena trazer para o debate público”, respondeu Galípolo. E sobre a decisão da taxa de juros, acrescentou: “A quantidade de informação trazida pelos técnicos facilita muito o processo. Foi amplamente noticiado que houve uma divisão, 5 a 4, mas todos os pontos que foram colocados de maneira absolutamente corajosa e transparente na ata são questões técnicas defensáveis, seja qual for a visão. A divergência era sobre iniciar com corte de 0,25 ou 0,50 ponto percentual e no fim do dia havia uma unanimidade sobre o que fazer dali em diante”.

O diretor de Política Monetária do Banco Central respondeu também às perguntas dos jornalistas presentes ao ambiente virtual. A transmissão completa do debate pode ser assistida clicando AQUI.