Belluzzo: “Enfrentamento da pandemia foi frágil

A palestra magna do XXIV Congresso Brasileiro de Economia ficou a cargo de Luiz Gonzaga Belluzzo, doutor em economia pela Unicamp, e o tema de sua fala foi recuperação econômica pós-pandemia. Para começar sua explanação, Belluzzo contextualizou a forma como o Brasil chegou à situação atual. “Nós não fomos machucados apenas pela pandemia, fomos gravemente prejudicados porque ocorreu uma ruptura nos circuitos de formação de renda e circuitos de oferta e demanda. Circuitos monetários”, iniciou.

Belluzzo tratou da depressão de 2015/16 como resultado da pretensão de um ajuste ortodoxo que resultou num desajuste. “A economia colapsou, nós tivemos uma depressão, e a pretexto de promover um ajuste foi promovido um desajuste, inclusive com agravamento da situação fiscal. O Brasil teve superavit primário em todo o período anterior, desde 1998”, pontuou o palestrante. “A economia sofreu uma desaceleração com forte influência de fatores externos, mas também com equívocos na política doméstica”.

A desindustrialização vivida pelo Brasil foi abordada por Belluzzo. “Entramos na crise da dívida externa em 1980 com a indústria de transformação representando de 36% a 37% do PIB. Industrialmente, o Brasil era muito mais desenvolvido que a China ou a Coreia”, comentou. “A partir dos anos 90, com taxas de juros muito elevadas e câmbio valorizado, a indústria brasileira foi perdendo substância e competitividade. Além disso, este era o momento de explosão do desenvolvimento chinês. Desde a ascenção da China, houve queda na participação da indústria no PIB americano de 25% para 12%, na França caiu para 14%, todos eles sofreram com o avanço chinês”.

Durante a pandemia, as políticas adotadas foram insuficientes para promover uma reação mais forte, na visão de Belluzzo. “O enfrentamento foi frágil. Buscou assegurar um rendimento mínimo de algumas camadas da população, mas era preciso fazer uma política econômica, um planejamento econômico que permitisse a recuperação equilibrada de todos os setores. Isso não aconteceu”, argumentou o palestrante. “Usei a metáfora do planejamento de guerra, que mobiliza certos grupos sociais no movimento de sustentação dos vários setores econômicos. Isso exige planejamento. Tivemos uma recuperação assimétrica, e hoje essa assimetria sofre os danos da crise hídrica e da política de preços”.

Belluzzo também criticou as políticas dos últimos governos. “O ambiente sociopolítico e as convicções dominantes daqueles que influenciam as decisões do estado não são apropriados a uma recuperação mais rigorosa da economia. Há este empecilho do teto de gasto, eu converso com economistas estrangeiros e eles ficam entre deplorar profundamente e gargalhar do teto de gastos”, afirma. “Estamos vendo a reação de Biden, ele está mobilizando a política monetária e fiscal para uma reação mais vigorosa para a economia americana. O gasto dirigido, precisamos ter claro, tem que ser em setores tecnologicamente importantes. Nos Estados Unidos o gasto militar sempre foi decisivo para a pesquisa tecnológica. A Califórnia não existiria sem este gasto”.

Ao falar da reforma tributária, acredita que ela causará uma perda de 5% das receitas em comparação ao que havia antes. “E esse temor da dívida pública não corresponde a nenhum efeito catastrófico se a dívida está em moeda local. As crises de endividamento ocorrem quando a dívida é em moeda estrangeira”, questionou Belluzzo, mencionando ainda três grandes estabilizações da relação dívida/PIB: a ocorrida nos Estados Unidos após a guerra civil, a ocorrida na França após a guerra Franco-Prussiana e a ocorrida na Inglaterra após as guerras napoleônicas. “A recuperação foi feita rapidamente com a taxa de crescimento da economia, um crescimento maior do que a taxa de juros”.

Belluzzo falou sobre os críticos da atuação do estado. “Acho ridículo. O Brasil precisa da atuação do estado e dizem: ah, o estado gasta mal. Então ensine a gastar bem! Ah, o estado aloca mal os recursos. O mercado aloca bem? E a crise de 2008/2009? Se o problema é a má alocação, chame gente competente para definir claramente os objetivos da política econômica. É o que o Biden está fazendo”, afirmou o palestrante. “Dizem que o problema é o espaço fiscal. Mentira. Não tem nada a ver. As pessoas dizem que é preciso austeridade, equilíbrio fiscal, para aí termos uma situação favorável. Não é verdade. Em todo o período em que avançou, a China controlou os capitais de curto prazo”.Finalmente, Belluzzo disse que uma recuperação pós-pandemia precisa de um arranjo institucional muito bem montado.