Artigo – Os cuidados para a recuperação do crescimento

Edmund Phelps, Nobel de Economia, costumava frisar que “todo economista profissional e competente conhece a importância do princípio fundamental macroeconômico: o equilíbrio fiscal que assegura a estabilidade dos principais preços da economia, sem o qual o crescimento se torna imprevisível”. A afirmação não é trivial, pois, uma vez afastado o equilíbrio das contas públicas, restam artificialismos fiscais e creditícios para estimular o consumo e os estoques de produção, acarretando desacauteladas taxas de juros, câmbio, salário real e emprego. Foi o que ocorreu no Brasil a partir de 2008.

À época, economistas brasileiros competentes alertaram que o excesso de estímulos à demanda sem contrapartida da oferta nos levaria ao abismo fiscal e ao desequilíbrio dos preços macroeconômicos. A estabilidade desses preços se reflete na normalidade dos juros do Banco Central – com inflação dentro da meta –, possibilita que a taxa de produtividade econômica permaneça acima da taxa de salário e torna previsível a taxa de câmbio de longo prazo. Os gestores da política econômica do governo federal não deram ouvidos a estes profissionais. Como se tudo isso não bastasse para agravar os preços e o desequilíbrio fiscal, a queda dos preços das commodities gerou prejuízos nas carteiras de investimentos, na conta corrente e arrastou a economia para a maior recessão jamais registrada na nossa história. A política econômica brasileira da época procurou contornar os efeitos desastrosos da retração econômica por meio da expansão da dívida pública federal e aumento dos gastos públicos de Estados e municípios. Isso demonstra a total perda de bom senso profissional na condução da política macroeconômica.

A lição desta crise fiscal tem uma didática: representantes do povo, sindicatos de trabalhadores, empresários e famílias devem vigiar os impropérios do governo federal, de Estados e municípios e exigir, de forma organizada e efetiva, a responsabilidade pelo equilíbrio fiscal.

Há duas medidas em curso, promovidas pelo governo Temer, que poderão convergir para o equilíbrio entre receita e despesas públicas no longo prazo e, assim, estimular o crescimento do superávit primário. A primeira foi a aprovação da desvinculação em 30% das receitas em relação aos gastos públicos. A segunda estabelece que tanto as despesas públicas como o salário mínimo serão indexados pelo nível de inflação do ano anterior. Essas medidas representam a segunda melhor alternativa, pois a melhor seria indexá-los pela meta bianual da inflação, adotando ações compensatórias enquanto os preços não se estabilizarem em torno da meta. Nesse sentido, à medida que a inflação for se acomodando em torno da meta, receitas, gastos e reajustes salariais se estariam alinhando, permitindo a sustentabilidade do crescimento, do superávit primário e redução mais rápida da dívida bruta. Como ainda se vive em meio à tempestade fiscal e política, a sugestão poderá ser implementada num futuro próximo.

De qualquer forma, a política fiscal em curso aponta na direção correta: gastos e receitas deverão crescer no mesmo ritmo, reduzindo gradualmente o déficit de R$ 170 bilhões, de modo a reverter a taxa de aceleração do crescimento da dívida bruta do setor público. Para consolidar o princípio fundamental macroeconômico, será imprescindível reformular as regras atuais da Previdência Social, estabelecendo idade mínima para a aposentadoria de homens e mulheres e racionalidade nos programas assistenciais, removendo-os da conta da Previdência e transferindo-os ao Tesouro Nacional. Devem ficar na contabilidade da Previdência despesas típicas, e não as de assistência social, bem como a promoção da previdência complementar.

Tais medidas exigem sacrifício social temporário, comprometimento político dos governantes com a responsabilidade fiscal e os reajustes dos benefícios da Previdência Social com o equilíbrio fiscal que possibilite o crescimento e o desenvolvimento harmônico ao longo das próximas décadas.

É preciso entender o que está em risco: o futuro da aposentadoria da atual população ativa, como também a dos que ainda não entraram no mercado de trabalho. A sociedade, pois, deve clamar por maior responsabilidade fiscal do setor público, que possibilitará o bem-estar dos brasileiros, efetiva competitividade dos agentes econômicos privados e crescimento real da renda por habitante com pleno emprego.

 

Ernesto Lozardo, presidente do IPEA.