Economistas da Fazenda já participaram de debate no Cofecon

O economista Gabriel Galípolo, escolhido pelo futuro ministro Fernando Haddad para ser secretário-executivo do Ministério da Fazenda, já participou de um debate realizado pelo Cofecon. Em 06 de maio de 2021 o tema abordado foi a política monetária e, além de Galípolo, também esteve presente o economista Guilherme Mello – que faz parte da equipe de transição do novo governo, no grupo de trabalho Economia. O debate pode ser assistido clicando AQUI.

Relembre o debate 

Galípolo começou sua fala argumentando que as metas de inflação, que existem desde os anos 80, trazem consigo a ideia de que a moeda é endógena. “É a ideia de que não importa controlar a quantidade de moeda existente. O que importa é controlar, através do preço, do custo de oportunidade de preservar a riqueza na forma líquida, ou não”, apontou. Em seguida, citou uma fala de Alan Greenspan, na qual afirma que o país sempre poderá emitir moeda para pagar a dívida; e outra de Jerome Powell, dizendo que para inundar o mercado com liquidez não é preciso imprimir dinheiro, que isso pode ser feito digitalmente. 

Os bancos centrais promoveram o chamado “quantitative easing”. “Se eu somar os cinco principais bancos centrais do mundo, eles injetaram 30 milhões de dólares no mercado financeiro para sustentar e fazer o preço destes ativos. Comprando títulos no mercado secundário, o banco central controla a taxa de juros de longo prazo”, apontou o economista. Isso é relevante porque em 2008 se aprofunda uma nova forma de rentismo: “Ele vive da queda na taxa de juros, o que provoca uma elevação no valor presente dos títulos, e quanto menor a taxa de juros, maior o valor presente”. 

Galípolo apontou para a necessidade de que a política fiscal acompanhe a política monetária. “Para ampliar a moeda não enquanto reserva de valor, mas enquanto poder aquisitivo e meio de pagamento. Esse gasto é que vai gerar renda e reativar o consumo”, argumentou. Em seguida, tratou do caso brasileiro: “Em 2013 e 2014 a taxa de juros foi de 7 para 14%, e em 2015 fizemos aquele ajuste que zera os investimentos. Agora chegamos à taxa de juros tão baixa pelo excesso de liquidez que havia na economia internacional. Com a retomada da atividade econômica nos Estados Unidos e Europa os juros vão subir. Estamos ficando com o pior dos mundos: nosso programa de metas de inflação é uma muleta para a âncora cambial. Apesar da atividade econômica ainda estar apática, estamos tendo que subir os juros”. 

Ao falar sobre a recente alta nos juros, apontou que o mandato do Banco Central, com a recente adoção da autonomia, deveria observar também o emprego. “Isso foi percebido no comunicado com Copom ontem. Mas estamos subindo os juros porque entendemos que o crescimento está vindo mais rápido e forte do que deveria. Como é que você vai falar isso para as pessoas? Não está acontecendo nada disso na vida delas. É o efeito do câmbio”, criticou o economista. “Temos um problema de câmbio, uma moeda não conversível. Por isso, deveríamos fazer mais do que os outros países fazem. Temos que atuar também no mercado de câmbio”. 

Mello destacou a política monetária como um tema que tem ganho relevância e complexidade, uma vez que a crise de 2008 obrigou a repensar a macroeconomia. “O tema vem passando por uma transformação gigantesca na implementação de políticas públicas”, comentou. “A política monetária era um instrumento importante, mas não central no arranjo de políticas macroeconômicas. No arranjo financeiro e monetário pós-Bretton Woods foi dado mais espaço para a atuação das políticas nacionais e para a utilização de política fiscal”. 

O economista caracterizou a política monetária até os anos 70 como algo discricionário, que não seguia necessariamente uma regra. Com o fenômeno da estagflação e a ascensão de governos conservadores (como os de Margareth Tatcher e Ronald Reagan) vem a primeira onda monetarista, trazendo a visão da inflação como um fenômeno monetário. “Eles defendiam que a velocidade de circulação da moeda era constante e criavam hipóteses ad hoc, e foi a partir daí que a política monetária passou a estar submetida a uma regra”, argumentou Mello. “E a regra era: aumentar a base monetária conforme se aumenta a renda e o produto. É um fracasso retumbante, porque é descolado dos mecanismos de funcionamento do capitalismo. O fracasso foi abandonado, mas não a ideia de que deveria haver regras”. 

A crise de 2008 trouxe uma mudança de entendimento da política monetária. “Os policy makers perceberam que os modelos e a teoria utilizada não dão conta da realidade e têm furos enormes, seja na concepção sobre a moeda, seja sobre a política fiscal”, observou o palestrante. Comentou o caso do Japão, onde o estímulo à inflação levou a taxa de juros real a um patamar negativo. “Houve uma quebra de paradigmas, com o salvamento de empresas e o abandono de qualquer regra de política monetária. Em alguns países a taxa de juros foi para abaixo de zero. Os Bancos Centrais passaram a atuar em todo o espectro da taxa de juros, no curto, médio e longo prazo”. 

Quando se realizou o debate, o mundo convivia há pouco mais de um ano com a pandemia causada pela Covid-19. “A política monetária continua absolutamente não convencional. O Banco Central japonês é acionista majoritário de centenas de empresas e compra ações para manter a bolsa se valorizando e evitar uma crise financeira. A Alemanha compra empresas para que não sejam vendidas para a China”, apontou Mello. “O Banco Central Europeu pede que os Estados gastem. Enquanto isso, nós reduzimos a taxa de juros, promovendo uma fuga de capitais. Nessa inflação gigantesca que temos não há nenhum controle de capitais. Estamos numa recessão aumentando a taxa de juros. Só este aumento já nos custou todo o auxílio emergencial do ano passado”. 

Os convidados 

Gabriel Galípolo, que faz parte da equipe de transição no grupo de Infraestrutura, é graduado e mestre pela PUC-SP. Ele foi presidente do Banco Fator até 2021, é professor da UFRJ, pesquisador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais e conselheiro da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).  

Guilherme Mello é graduado em Ciências Econômicas (PUC/SP, 2006) e em Ciências Sociais (USP, 2008), Mestre em Economia Política (PUC/SP, 2009) e doutor em Ciência Econômica (Unicamp, 2013). Atua como professor e coordenador do programa de pós-graduação em desenvolvimento econômico do Instituto de Economia da Unicamp.