Artigo – Casamento sinistro

Júlio Miragaya – Ex-presidente da Codeplan e do Conselho Federal de Economia. Artigo originalmente publicado no site BSB Capital – https://www.bsbcapital.com.br/casamento-sinistro/

A primeira semana de junho fechará com o incrível número de 6 milhões de infectados e 400 mil mortos pelo COVID-19 no mundo. Estados Unidos e Brasil são os dois países com maiores contingentes contaminados e que, nos últimos dias, têm respondido por metade dos mortos, e isso não é mera coincidência. Tal situação decorre do fato de serem presididos por negacionistas, extremistas de direita que literalmente estão se lixando para a sorte de seus povos, inclusive sob a ótica econômica.


Sim, tanto lá como aqui, o discurso de desprezar o isolamento social e priorizar a economia não passa de tentativa de encobrir o fracasso de suas políticas econômicas, amplamente direcionadas para proteger o grande capital e retirar conquistas históricas dos trabalhadores. O fato é que ambos, assim como alguns governantes europeus, ao negligenciarem o combate ao COVID-19, amplificaram a disseminação do vírus e estenderam os efeitos negativos para um tempo prolongado, ao contrário de outros países, como China, Taiwan e Austrália, que já controlaram o vírus.


Enquanto nos EUA Trump busca na China o seu bode expiatório, no Brasil, Bolsonaro prossegue em sua cruzada de negar a gravidade do Coronavírus e trata com desdém as mais de 30 mil mortes (considerando as subnotificações e registros em atraso, estima-se que sejam mais de 50 mil). De outro lado, o ultraliberal Guedes nega o auxílio emergencial de R$ 600 para milhões de trabalhadores pobres e dificulta o acesso a empréstimos a milhões de micro e pequenas empresas, enquanto garante bilhões para os bancos e as grandes corporações. E neste quadro de desatino, os generais e ministros da Defesa e do GSI, respaldados por 3 mil militares “com boquinhas” no governo, apressam-se em emitir notas ameaçando nossa débil democracia.


Este sinistro casamento do neoliberalismo com a militarização do governo vai gerando em seu ventre um enorme retrocesso econômico, social e político, com consequências dramáticas. Num país de extrema desigualdade social, seu legado será a desestruturação da economia nacional, o desmonte dos serviços públicos e o aumento da concentração da renda, da pobreza e da miséria.


PS. Aguarda-se uma reação, ainda que tardia, do governador do DF Ibaneis Rocha ante às declarações do Ministro da Educação (sic) de “querer acabar com essa porcaria que é Brasília”, declaração tão agressiva que fez Ana Laura, minha filha, brasiliense de 8 anos e que ama esta cidade, chorar copiosamente ao ouvi-la e perguntar: “pai, porque então ele veio morar aqui”?