Cofecon realizou debate sobre Censo 2020

O Conselho Federal de Economia realizou nesta sexta-feira (24) um debate de conjuntura, por ocasião de sua 690ª Sessão Plenária. O tema foi o corte no orçamento do Censo 2020 e o debatedor foi o economista Claudio Dedecca, professor aposentado da Universidade de Campinas.

Dedecca iniciou falando sobre a extensão das informações do censo. “No setor privado, todas as pesquisas de mercado e opinião cruzam com os dados do censo demográfico em alguma informação. As pequisas eleitorais utilizam as faixas de renda para ajustar a amostra e dar o peso adequado a cada faixa em termos de resultados”, afirmou o economista. “No setor público, há a própria gestão das políticas públicas, identificando bolsões de pobreza, demandas por vacina, por atendimento básico, entre outros. E há o uso do censo nas pesquisas acadêmicas – para ter uma ideia, o censo é usado nos estudos sobre transporte e emprego, por exemplo”.

Uma das fontes de tensão, observou o professor, decorre do que ele chamou de financiamento equivocado do IBGE. “O financiamento é de R$ 1,5 bilhão ao ano, e o censo custa R$ 3 bilhões. No quinto ano da década eu deveria ter uma contagem populacional e o censo agropecuário, e nos anos de final zero o censo demográfico e também o agropecuário. O IBGE deveria ser financiado de acordo com um plano decenal de estatística, constituindo um fundo, e nos anos em que houver uma demanda maior, o fundo cobre, sem necessidade de disponibilizar um orçamento adicional”, argumentou Dedecca. “Isso é importante porque agora temos uma crise fiscal. O Ministério da Economia teria que aportar R$ 1,5 bilhão, mais R$ 3 bilhões. Há um modo operante que é incorreto quando se considera o fluxo do que a instituição realiza”.

Após comentar alguns exemplos de censos em outros países, destacou uma particularidade do caso brasileiro: “Este é o único levantamento de informações no nosso país com capilaridade para todo o território nacional. Esta diversidade populacional que o país carrega, independentemente da nossa visão sobre cada uma destas populações, precisa ser conhecida e mensurada”, apontou.

Em seguida, o economista falou sobre um questionário enxuto, aplicado a três quartos da população, e um questionário longo – que, embora tenha mais de 110 perguntas, a pesquisa piloto mostrou que, em média, são realmente utilizadas 44. “Hoje não se usa mais um questionário de papel, e sim um coletor eletrônico. E eu só passo nas questões que fazem sentido no roteiro de respostas que o indivíduo vai dando. Qual a aplicação disso? Para enxugar de fato as questões respondidas, é preciso investigar na carne, na coleta de informação socioeconômica. Reduzir de 44 para 20 significa reduzir boa parte das perguntas de natureza social”.

Uma das críticas que se faz ao censo é que sempre há algumas pessoas que não são entrevistadas. “Isso é comum em todos os censos demográficos, e há técnicas estatísticas robustas para fazer a correção deste problema”, explicou. “Qual a recomendação internacional? Melhorar o treinamento, a organização do censo e das atividades e uma ampla divulgação de convencimento da população. Perguntei à presidente do IBGE qual é a estrutura de gastos das atividades a realizar e não recebi resposta. Há um corte sem pensar numa estratégia”.

Ao falar sobre a integração das informações do censo com informações de outras bases (como Previdência, censo escolar, Datasus, entre outras), afirmou que ainda não há a consistência necessária. “A ideia de fazer um censo mais enxuto e aproveitar os registros administrativos é apostar numa estratégia de alto risco e, na minha opinião, fadada ao insucesso”, opinou Dedecca.

Ao falar sobre o trabalho já realizado para 2020, o professor informou que já foram feitas duas pesquisas piloto. “Há um trabalho estabelecido que vinha sendo realizado de forma contínua com a colaboração de todos os que participavam disso, mas houve uma quebra de autonomia no IBGE e o governo reduziu para R$ 1,8 bilhão o orçamento”, comentou o professor. “O governo quer fazer o censo, seja ele qual for, e por duas razões: primeiro, porque não realizá-lo seria um vexame, e segundo, porque este é um dos requisitos para entrar na OCDE. O Ministério da Economia não chegou dizendo que precisávamos de ajuste e que nós discutíssemos o que fazer com o censo. O que se disse foi: o recurso é este, temos que fazer assim. E isso foi encaminhado à revelia dos técnicos do IBGE”.

Ao falar sobre a possibilidade de mudança no questionário do censo, alertou para um risco: “Eu posso ir a campo no ano que vem com um questionário que não foi testado numa pesquisa piloto. Quem já trabalhou em pesquisa sabe o tamanho da encrenca”, explicou. “Não tenho dúvida de que a qualidade do censo está comprometida. Corremos o risco de ter um apagão de informação para a próxima década, para as políticas públicas e para o setor privado. Não estamos falando de um anuário estatístico de dados para divulgar na internet ou na imprensa, mas de subsídio real, de qualidade, para a execução de políticas. Teremos uma década de dificuldades, pelo fato de que o censo é a única informação que me traz dados da fronteira de Roraima até o sul do país”.