A importância crescente do ESG na economia moderna: entrevista com Lauro Chaves Neto

Nesta entrevista, recebemos o economista Lauro Chaves Neto para discutir a trajetória e a importância cada vez maior das práticas de ESG (Environmental, Social, and Governance) no ambiente de negócios contemporâneo. Sua formação acadêmica inclui um diploma da Universidade Federal do Ceará (UFC) e uma especialização em Administração Contábil e Financeira pela EASP Fundação Getúlio Vargas -SP. Chaves Neto ocupou posições de liderança, como a presidência do Conselho Regional de Economia (CORECON-CE) e do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (IBEF), e atualmente serve como professor na UECE, assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) e Conselheiro Efetivo do Conselho Federal de Economia (COFECON).

Ao longo da conversa, o economista nos oferece uma visão abrangente sobre o ESG, analisando sua história, sua relevância para as empresas modernas e para a economia em geral. Além disso, ele aborda a influência do ESG na análise de risco financeiro e nas decisões empresariais. Ele também contempla o impacto da pandemia da COVID-19 na perspectiva do ESG e os passos necessários para impulsionar a sustentabilidade em um mundo em recuperação.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva ao Jornal Economic News Brasil:

ENB: Poderia nos explicar a origem e o significado do conceito de ESG, bem como sua importância para a economia e as organizações atuais?

LCN: O primeiro ponto é explicar de onde vem o conceito de ESG. Antigamente se falava que o desenvolvimento dependia do crescimento da economia. Depois nós avançamos e falamos que não só precisa a economia crescer, mas precisa melhorar a qualidade de vida. No início da década de setenta, a ONU avançou na sustentabilidade, criou o conceito de desenvolvimento sustentável, que combinava os aspectos econômicos, os aspectos sociais e os aspectos humanos. Isso se falava muito em termos de macroeconomia, ambientes e políticas públicas. O ESG foi o grande avanço em trazer o conceito de sustentabilidade ambiental, social e de governança da macroeconomia para dentro das organizações, para a realidade prática da microeconomia. Então, esse esclarecimento inicial é muito importante, porque muita gente acha que não compreende de onde veio o conceito de ESG e como isso acontece.

ENB: Pergunta adequada para a resposta: Como a adoção do ESG tem sido facilitada para empresas de diferentes tamanhos no estado do Ceará e qual a importância do papel da FIEC neste processo?

LCN: As empresas cearenses possuem cada vez mais ferramentas para implantar o ESG. Isso vale tanto para as grandes como para as pequenas e médias empresas. Se nós temos hoje no estado do Ceará um ambiente mais favorável, o presidente Ricardo Cavalcante, na FIEC, criou um núcleo da Federação das Indústrias do Estado do Ceará dedicado à prática ESG. Esse núcleo realiza treinamento, capacitação, auditoria, e aquelas empresas que passam na auditoria das práticas de ESG recebem o selo ESG. Este selo traz ganhos financeiros e de parcerias com os fornecedores e clientes das indústrias. Esse exemplo deve ser copiado, otimizado, e adequado para todos os setores da economia cearense. Nós podemos pensar nisso no Sebrae, para as pequenas empresas. Nós podemos pensar isso na Fecomércio para os comércios. E nós podemos pensar isso dentro das entidades de classes muito especializadas, seja por setor ou por territórios, porque trabalhando dessa forma pelas cadeias, pelos arranjos produtivos, nós temos um potencial de disseminar a prática de uma forma muito mais disseminada em toda a economia cearense.

ENB: Como as práticas de sustentabilidade e a implementação do ESG podem influenciar a análise de risco financeiro das empresas e, consequentemente, a rentabilidade e o crescimento do negócio a curto e longo prazo?

LCN: A análise do risco financeiro das empresas está vinculada à questão da rentabilidade de curto prazo e à sustentabilidade de longo prazo das organizações. Simultaneamente, isso aumenta o ganho financeiro de curto prazo. Já falamos disso na pergunta anterior. Com a redução de desperdícios, com reaproveitamento, com a interação com a comunidade, com o desenvolvimento dos colaboradores, com a preservação ambiental, tudo isso aumenta a rentabilidade no curto prazo e aumenta a sustentabilidade no longo prazo. Com isso, você reduz a percepção do risco daquela organização tanto para o sistema financeiro que financia aquela empresa, como também para os stakeholders em toda a cadeia do negócio. E isso traz ganhos de sinergia e ganhos de parcerias estratégicas. E isso alavanca ainda mais o crescimento dos negócios.

ENB: De que maneira a implementação das práticas de ESG tem impacto na economia brasileira e, mais especificamente, na economia cearense, especialmente quando se trata de pequenas e médias empresas? Como essas práticas podem afetar a rentabilidade e o crescimento das empresas a curto e longo prazo? 

LCN: Como as práticas de sustentabilidade e a implementação do ESG podem influenciar a análise de risco financeiro das empresas e, consequentemente, a rentabilidade e o crescimento do negócio a curto e longo prazo? A prática do ESG vem se acelerando em todos os setores da economia, mas, sem dúvida, aqueles setores que são integrados às cadeias globais de valor, seja como fornecedores, seja como clientes, seja como parceiro tecnológico, estratégico ou de investimento das cadeias globais de valor. Eles, no Brasil, têm acelerado de uma forma muito mais intensa a prática do ESG. Porque se você pegar a Europa, os Estados Unidos e parte da Ásia, essas práticas têm se acelerado bastante. Então as empresas brasileiras, e, por sinal, as empresas cearenses que estão integradas às cadeias globais de valor, são essas que estão usando e passando a usar cada vez mais de uma forma intensa. ESG. Isso é muito importante para nós usarmos como benchmark. Porque? Porque nós temos uma economia cearense que é dominada principalmente pelas pequenas e médias empresas. Então nós temos um papel muito grande em disseminar essa cultura nas pequenas e médias empresas. E nós sabemos que a realidade das pequenas e dos pequenos negócios é muito diferente. Nos pequenos negócios, o empreendedor, ao mesmo tempo, ele é o financeiro, o comercial. Ele é a produção, ele faz tudo na empresa dele. Então, essa vai ser uma atividade que requer tempo, atenção e prioridade para esse pequeno negócio. E é esse o grande desafio que nós temos que avançar para que o ESG esteja mais presente cada vez mais na cultura empresarial cearense.

ENB:Como a agenda ESG tem influenciado as decisões de instituições financeiras e empresas, e quais são alguns exemplos recentes dessa influência na indústria cearense? 

LCN: As tomadas de decisões dentro das organizações, assim como as das instituições financeiras que possibilitam os investimentos de expansão, modernização e instalação, têm sido cada vez mais pautadas pela agenda ESG. Os maiores fundos de investimentos do mundo já oferecem financiamento com taxa de juro mais baixa para aquelas empresas que realmente têm práticas sustentáveis no âmbito econômico, social e de governança. Várias instituições financeiras brasileiras estão começando a diferenciar as empresas que praticam o ESG das que não praticam, em termos de atendimento e taxa de juros. Do lado dos financiadores, a decisão de investimento por parte das empresas também é cada dia mais influenciada pelos conceitos de sustentabilidade. O caso mais recente no nosso Estado do Ceará foi a ArcelorMittal, que comprou a Companhia Siderúrgica do Pecém, a nossa maior empresa, e indicou que um dos motivos da aquisição é porque a Mittal Pecém tende a ser uma das primeiras plantas da ArcelorMittal no mundo a produzir o aço verde, ou seja, com a descarbonização de toda a planta, passando a usar provavelmente hidrogênio verde. Teremos aqui no estado do Ceará, aço verde, o que nos permitirá avançar para uma série de usos do aço, como carro elétrico, linha branca e uma série de outros usos do aço verde.”

ENB: Como a pandemia da COVID-19 afetou a economia mundial em relação ao ESG e quais medidas podem ser tomadas para promover a sustentabilidade, considerando a necessidade de melhorar a qualidade de vida e combater as mudanças climáticas?

LCN: A pandemia da COVID-19 impactou a economia em todos os aspectos, inclusive no que se refere ao ESG. A pandemia, com suas inúmeras mortes, afetou todas as famílias e organizações. O lockdown, que restringiu a qualidade de vida durante certo período em todo o mundo, fez com que as pessoas valorizassem cada vez mais a qualidade de vida, algo intrinsecamente ligado à sustentabilidade social e ambiental. Atualmente, estamos passando pelo mês mais quente da história da humanidade, resultado de práticas não sustentáveis. Quando essas práticas não sustentáveis são adotadas em todo o mundo, principalmente pelos dois principais países emissores, que são os Estados Unidos e a China, a necessidade de reduzir essas emissões se torna ainda mais evidente. Através da sustentabilidade em toda a cadeia de valores, a ciência econômica tem muito a contribuir com práticas como economia circular, integração, reuso de resíduos e produção sustentável. Tudo isso contribuirá para uma economia mundial mais limpa, permitindo que tenhamos uma qualidade de vida maior a cada geração e não uma qualidade de vida ameaçada pela insustentabilidade da economia mundial.

*Entrevista publicada originalmente pelo Jornal Economic News Brasil.