Em audiência pública, conselheiro defende “fugir dos dogmas” e reduzir os juros

O conselheiro federal Antonio Corrêa de Lacerda participou nesta quarta-feira (12) de uma audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados. O tema do encontro – organizado por requerimento do deputado Félix Mendonça Júnior – foi “Avaliar os recentes aumentos nas taxas de juros e seu impacto sobre a dívida pública”.

“A questão da taxa de juros é tratada estrategicamente pelos principais Bancos Centrais do mundo. Ela define o custo de capital e é relevante por todas as suas consequências”, comentou o economista, enquanto apontava para o fato de que somente em 2022 as taxas de juros ao redor do mundo voltaram ao nível pré-crise de 2008.

Uma das consequências dos juros altos, explica Lacerda, é seu efeito sobre os investimentos. Ele pontuou que entre 2019 e 2022 a taxa de investimentos no Brasil esteve entre 15 e 16% do PIB – comparando com 33% dos países em desenvolvimento e 20 a 21% de países como Chile, Peru e México. “Estamos no pior nível da nossa história. Para isso colaborou não apenas a taxa de juros elevada, mas também a emenda constitucional 95. O Executivo, diante das demais pressões por gastos correntes, acaba sacrificando os investimentos”, criticou.

Outra consequência dos juros altos está no desemprego. Somando os desocupados (8,6 milhões de pessoas ao final de 2022), desalentados (4 milhões) e subocupados (8,7 milhões), mais de 21 milhões de pessoas estão fora do mercado de trabalho ou não trabalham tanto quanto gostariam e poderiam. “Isso é pouco mais de um quinto da população economicamente ativa, que está também fora do mercado de consumo. Estamos desperdiçando uma população maior do que a de muitos países. Sem falar nos indicadores de fome: 33 milhões de pessoas passam fome e pouco mais que a metade da população brasileira está em insegurança alimentar”.

Uma vez que o tema do debate envolvia a dívida pública, Lacerda também trouxe números. “Mesmo considerando que podemos terminar 2023 com uma taxa de juros dois pontos menor que a de hoje, e levando em conta a inflação do período, é uma taxa real próxima de 6%, elevada para qualquer padrão. O Brasil é um caso único de taxas de juros elevadas por tanto tempo”, comentou. “O déficit público é basicamente financeiro, é provocado pelo elevado custo de financiamento da dívida pública. Pagamos quase R$ 600 bilhões no ano passado e, pelo andar da carruagem, chegaremos a R$ 700 bilhões neste ano. Significa, grosso modo, dizer que o pagamento de juros é 10 vezes superior ao investimento público no âmbito federal. Essa equação não pode dar certo”.

Para demonstrar que o caso do Brasil é insólito, o economista apresentou um gráfico contendo a proporção do endividamento de vários países em relação ao PIB e o custo de rolagem da dívida. “O Japão deve 260% do PIB, mas o custo não chega a 2%. A Grécia, que vive uma situação fiscal gravíssima, deve 200%, mas o custo é de 2,5%. O Brasil, abaixo de 80%, é uma estrela solitária no alto do gráfico, com o maior custo de rolagem de dívida do mundo”, abordou Lacerda. “Temos que fugir dos dogmas normalmente presentes no debate público. É preciso atacar este problema, sem esquecer que impacta no custo de capital para pessoas físicas e jurídicas. Vemos pelo padrão internacional que é muito fácil de fazer. Basta ter vontade política e principalmente nos livrarmos de dogmas e paradigmas que estão presentes na definição da política monetária brasileira”.

O conselheiro Antonio Corrêa de Lacerda é Professor-Doutor do programa de pós-graduação em Economia Política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e membro da Comissão de Estudos Estratégicos do BNDES. Dedica-se continuamente à produção de artigos relevantes para o entendimento da conjuntura do país, regularmente veiculados em jornais de grande circulação. É colaborador do jornal O Estado de S. Paulo e comentarista do Jornal da Cultura (TV Cultura). Publicou cerca de 20 livros da área de Economia – entre eles, “Economia Brasileira”, “Desnacionalização” – vencedor do Prêmio Jabuti de 2001, na área de economia; “O Mito da Austeridade”; e “Reindustrialização: Para o Desenvolvimento Brasileiro”. Foi presidente do Cofecon por quatro mandatos.

Além de Lacerda, também foram ouvidos na audiência pública os economistas Fábio Henrique Bittes Terra, assessor especial do Ministério da Fazenda, e Nelson Marconi, coordenador do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da Fundação Getúlio Vargas. O evento pode ser assistido clicando AQUI.