Oficina de economia política

Por Manoel Castanho

No mês de agosto comemora-se o Dia do Economista e, como parte das comemorações, economista Rosa Maria Marques, professora titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), ministrou uma oficina de economia política, transmitida via internet pelo canal do Cofecon no YouTube. Todos os inscritos por meio da plataforma de Educação a Distância (EAD) do Cofecon receberam certificados.

Rosa, que também é ex-presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política e autora de vários livros no campo da economia brasileira, capitalismo contemporâneo e políticas sociais, abordou três grandes temas durante as aulas realizadas nos dias 03 e 12 de agosto: dominância financeira, neoliberalismo e a questão ambiental.

Dominância financeira

A professora caracterizou o capitalismo contemporâneo mencionando o processo de mundialização do capital (globalização) – circula cada vez mais rápido, no mundo todo, e cria cadeias mundiais de valor. “Ao contrário do que alguns pensam, não impede a especialização de alguns países na produção de determinadas mercadorias”, afirmou Rosa. No período, o capital portador de juros, que já havia sido dominante entre o fim do século 19 e o início do século 20, teve um crescimento exacerbado.

Após a Segunda Guerra, há um período de 30 anos nos quais as economias crescem, bem como os salários e lucros, a qualidade de vida melhora e a industrialização se dissemina. “No pós-guerra houve condições políticas muito particulares, com um fortalecimento de setores ligados a socialistas e das resistências ligadas ao enfrentamento do nazifascismo. E isso vai ser decisivo para definir como recuperar a Europa”, ponderou Rosa. As condições políticas do momento permitiram a implantação do Estado de bem-estar social (welfare state), a produtividade cresceu, os trabalhadores tiveram um crescimento do salário real e a taxa de crescimento do lucro começa a cair.

Rosa mencionou os três tipos de capital citados por Marx: capital industrial, comercial e a juros – sendo este último um dinheiro que faz dinheiro sem passar pelas agruras da produção. O capital portador de juros volta a ser dominante após o Choque do Petróleo, quando o pensamento liberal retorna na forma do neoliberalismo. “Toda a estrutura criada após o pós-guerra começa a ruir por meio de um processo de desregulamentação, que começa primeiro na área financeira, mudando o câmbio e permitindo que houvesse saída e entrada de capital de um lado para o outro”, explicou a professora. Esta situação gera a supremacia dos credores da dívida pública, o fechamento de filiais quando a taxa de lucro é inferior à rentabilidade mínima e um nível de investimento muito baixo.

Neoliberalismo

Durante anos recentes, quando vários governos aumentaram significativamente os gastos durante a pandemia, e depois que o presidente norte-americano Joe Biden anunciou seu plano de US$ 6 trilhões para estimular a economia, muitos disseram que era o fim do neoliberalismo. “É um equívoco”, comentou Rosa. “No neoliberalismo não há um Estado mínimo; ele é robusto e muitas vezes aumenta o endividamento. O maior exemplo disso são os Estados Unidos. O que ocorre é uma diminuição de gastos com políticas sociais, mas existem outras, ligadas à indústria de armamentos, em que o gasto se eleva.”

Na visão da professora, as pessoas não entendem o que é o neoliberalismo. “Ele é a expressão retórica dos interesses do capital portador de juros. O Estado só é mínimo em determinadas áreas, mas o gasto nunca deixou de crescer, abrindo espaço para a acumulação de capital do setor privado”, argumentou Rosa. “A defesa do mercado, de que não haja regulamentações, é uma justificativa para que o interesse do capital financeiro encontre eco e respaldo junto aos outros capitais e à sociedade em geral. O neoliberalismo só pode ir embora se, com ele, for também a dominância do capital a juros.”

Capitalismo e meio ambiente

Durante a pandemia, com as medidas de isolamento social, houve uma queda no consumo e mudanças sensíveis na qualidade do ar e da água, com a presença de animais silvestres em lugares onde não se faziam mais presentes. Questionou-se, então, se estas mudanças seriam permanentes – e a economista pontua que isso não seria possível: “O consumo exacerbado, um dos traços do capitalismo contemporâneo, é um dos pilares mais importantes da sustentação da reprodução ampliada do capital”.

Em 1987 surgiu o conceito de desenvolvimento sustentável, algo que não agredisse a natureza e não exaurisse suas qualidades e potencialidades, garantindo a recuperação e o uso pelas gerações futuras. “O problema é que esta ideia tem como pressuposto a possibilidade de a reprodução do capital ser conciliável com a necessária ação reparadora. Mas esta conciliação não tem onde se apoiar”, explanou Rosa. “O modo de produção capitalista independe da vontade do capitalista. Busca o aumento da produtividade, que é o meio de obter um lucro extraordinário, sem importar se o método é ecologicamente adequado ou não. Não há como conciliar o capitalismo com a natureza. Pode-se apenas mitigar.”

Por fim, apresentou conceitos como o Bem Viver e o Ecossocialismo. O primeiro está presente nos povos nativos da América do Sul; o último rejeita a ideia de progresso baseado em crescimento quantitativo. Para chegar neste resultado, seria preciso organizar a economia colocando as necessidades humanas e do planeta em primeiro plano, com um planejamento democrático, trazendo de volta a supremacia do valor de uso em vez do valor de troca. “Mas qualquer proposta neste sentido precisaria de um tempo de transição, e mesmo os autores não conseguem definir quanto”, concluiu.

Para ler a matéria na íntegra, acesse a edição de setembro da Revista Economistas: