Crescimento em perspectiva de longo prazo

Ainda sob a interminável pandemia do Coronavírus, foi conhecido o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) da economia brasileira no 1° trimestre de 2021. O dado positivo provocou otimismo nos agentes econômicos, sobretudo após a queda inédita da atividade apresentada em 2020. O crescimento do 1° trimestre, embora positivo, ainda pode ser considerado tímido e o descontrole da pandemia, somado ao possível colapso energético na região Sudeste, sugerem prudência nas estimativas para o ano, até para que o otimismo não se torne frustração.

O crescimento de 1% ocorreu frente a um recuo de 0,3% no primeiro trimestre do ano passado e após 4 trimestres de queda consecutivas na atividade verificadas em 2020. Este dado indica que o Brasil voltou para o nível pré-pandemia. Entretanto, as taxas de crescimento verificadas antes da pandemia eram baixas, de forma que o país apenas voltou para o padrão anterior de baixo crescimento e de PIB per capita próximo de 0%.

Pelo lado da oferta, percebe-se que este crescimento se deu muito calcado no desempenho do setor agropecuário, fomentado por preços atrativos de commodities no exterior e por uma taxa de câmbio bastante desvalorizada. Isso, a princípio, impõe um desafio porque o setor agrícola é intensivo em capital e demanda pouco trabalho. Crescer ancorado no desempenho do campo é problemático, podendo causar o descolamento entre as curvas do produto e do emprego, ou seja, a atividade se acelera mesmo diante de taxas de desemprego estruturalmente elevadas. Em contraste, setores intensivos em mão de obra como os serviços, seguem paralisados, aguardando o desfecho da vacinação para retomarem seu crescimento.

Sob uma perspectiva de longo prazo, o Nobel de Economia Robert Solow sustentava que o crescimento das economias dependeria da combinação de entrada de novos trabalhadores no mercado de trabalho; somado ao aumento da produtividade e a capacidade de acumular capital. Neste sentido, o principal indicador positivo do PIB recém divulgado é a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) que voltou a crescer e já superou em muito os níveis anteriores à pandemia, isso pode indicar o início de um novo ciclo de crescimento mais sustentado.

Durante a crise de 2014, a taxa de FBCF entrou em declínio no 3° trimestre de 2013, permaneceu em queda até o 1° tri de 2016 e só retornou aos níveis iniciais no 3° trimestre de 2018. Dessa vez a retomada do investimento se deu com muito mais velocidade, a queda na FBCF teve início no 1° trimestre do ano passado, seu vale ocorreu no trimestre seguinte e, deste então, a formação de capital no Brasil vem se expandindo continuamente, de forma que desde o 4° trimestre os valores do FBCF já haviam ultrapassado, em muito, os valores pré pandemia.

A acumulação de capital parece ser fundamental para uma perspectiva de crescimento sólida do país na década que se inicia. Nos 40 anos compreendidos entre o milagre econômico em 1970 e 2010, o padrão de crescimento nacional se deu calcado na inclusão de novos trabalhadores no mercado de trabalho. Em outras palavras o perfil demográfico corroborou para que o país crescesse no período. A partir de 2010, este perfil vem mudando estruturalmente e os novos trabalhadores apenas repõem os trabalhadores que saem do mercado. Neste sentido, o Brasil depende de ampliar seu estoque de capital e aumentar a sua produtividade para voltar a crescer de forma sustentada por um longo período.

Sobre a produtividade, é preciso estar atento ao comportamento do setor manufatureiro. Isso porque Nicolas Kaldor sustentou que a indústria de transformação é principal o motor do crescimento das economias. Essa abordagem considera que este setor, por ser intensivo em inovações que vão gerar transbordamentos para os setores agrícola e de serviços, é fundamental para a manutenção de uma dinâmica consistente de crescimento em economias de grande porte.

Em ensaio publicado em 2019, estimei que a taxa de crescimento no emprego do setor industrial, contribui para o crescimento do PIB da economia brasileira com o triplo de intensidade do que a taxa de crescimento do emprego no setor de serviços. Para crescer de forma sustentada, o Brasil terá três desafios urgentes: manter o ritmo de crescimento em FBCF; gerar empregos na indústria e elevar a produtividade geral no setor de serviços. Não se trata de uma tarefa trivial.

Benito Salomão – Economista, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Economia UFU.