Em entrevista, conselheiro destaca a importância do capital humano no cenário pós-pandemia

Cenário econômico pós-pandemia no Ceará potencializa importância do capital humano
Economia cearense começa a traçar volta lenta e gradual, após mais de 70 dias de isolamento social. No momento em que tecnologia e inovação se tornam mais relevantes, força de trabalho qualificada se mostra como chave para retomada

30 de maio, 2020
Heloísa Vasconcelos

A economia cearense já começava a ensaiar uma retomada após anos de crise, quando chegou a pandemia do novo coronavírus. Após mais de 70 dias de queda, com paralisação de todos os setores não essenciais, as atividades econômicas começam a voltar na próxima segunda-feira, 1º.
O vírus trouxe impactos negativos nas arrecadações tanto estatais quanto privadas e coloca para sociedade uma nova realidade, com novos desafios e oportunidades. De acordo com economistas, em um novo mundo desconhecido, em que tecnologia e inovação se tornam essenciais, o capital humano qualificado se faz cada vez mais importante.


O impacto da pandemia do novo coronavírus na economia foi imediato e só deve conseguir ser quantificado completamente após seu fim. No Ceará, a queda de arrecadação do estado chegou a 30%. O desemprego também cresceu, com 25,6 mil empregos perdidos de janeiro a abril. Para o presidente do Conselho Regional de Economia Ceará (Corecon-CE), Ricardo Coimbra, os resultados da retomada gradual que se inicia devem ser observados apenas a partir de julho. “Quem sabe novembro ou dezembro a gente consiga estar em um patamar semelhante de antes da pandemia”, projeta.


Ele explica que no Ceará a economia é quase 70% focada no setor de comércio e serviços, que só devem voltar a operar na totalidade no fim do plano de retomada. “Eu creio que talvez o volume de arrecadação nesse primeiro momento vai ter uma diferenciação, como teve comércio e serviços parados, vai ter um volume maior da indústria. À medida em que voltarmos ao cotidiano, vai voltar a proporção normal”, analisa.


O conselheiro federal de economia e PHD em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona e professor da UECE, Lauro Chaves Neto, chama atenção para a importância da preparação profissional neste momento. “A formação do capital humano é o que vai virar a chave de tudo. Temos que aproveitar no nosso estado o Sistema S, colocá-lo cada vez mais dentro das empresas para que a formação seja muito ligada a empreendedorismo e inovação. Com isso, a economia cearense se torna mais competitiva, com mais valor agregado e mais sustentável para o futuro”, coloca.


Ainda segundo ele, a retomada será lenta para todos, mas ainda mais para setores ligados ao Hub aéreo do Ceará como o turismo, importante ponto da economia de Fortaleza. “O ano de 2020 para o setor de turismo e eventos já está morto, o ano de 2021 é uma incógnita, uma incerteza muito grande”, diz. O Hub portuário também encontrará dificuldades por depender substancialmente do comércio internacional. Ele considera provável que exista uma nova onda de protecionismo nos países, o que dificultará para as exportações.


Lauro Chaves afirma que o futuro da economia cearense tem oportunidades e ameaças, dependendo da estratégia de desenvolvimento do estado. Destaca a possibilidade de uma nova onda de reindustrialização mundial após diversos países desenvolvidos terem se visto dependentes da produção internacional neste momento de pandemia. “Nesse momento a economia cearense vai ter que ser muito inteligente para buscar oportunidades para complementar a cadeia produtiva desses países desenvolvidos”, indica.

Mudança do consumidor incentiva a economia criativa

Toda a forma de consumir mudou devido à pandemia. Compras online e delivery ganharam bem mais espaço e o consumidor tem percebido a importância de economizar, principalmente no momento atual, em que o desemprego ainda é um fantasma que ronda as relações trabalhistas. Nesse contexto, mesmo com abertura das portas e volta das atividades das empresas, empresários devem ser criativos para incentivar consumo e recuperar faturamento.

Para o presidente do Corecon-CE, Ricardo Coimbra, as formas de consumo reforçadas durante a pandemia, como e-commerce e delivery, vêm para ficar. “Esse novo normal vai estar muito relacionado ao comportamento antivírus, trabalhar mais em casa, menor movimentação dos indivíduos no comércio, nos serviços, no entretenimento. As pessoas antes tinham medo de compras por telefone, aplicativo, e agora é difícil retroceder em relação a isso”, coloca.

O conselheiro federal de economia, Lauro Chaves Neto, analisa que as pessoas devem se preocupar cada vez mais com saúde, alimentação, redução de gastos com bens que não sejam de primeira necessidade e convivência com famílias e amigos no pós-pandemia. “Como nós vamos ter uma renda menor para o consumidor para transformar em consumo, ele vai pensar duas ou três vezes. As empresas vão ter que ser muito criativas para estimular o consumo”, considera.

Responsabilidade fiscal e lideranças produtivas fortes colocam Ceará na frente para retomada

A situação do Ceará para a retomada da economia no pós-pandemia é melhor do que a de alguns estados com semelhante arrecadação. Segundo especialistas, a responsabilidade fiscal do estado nas últimas décadas e série de iniciativas que visam diminuir burocracia no ambiente de negócios por parte de lideranças do setor produtivo colaboram para que a queda ocasionada pela paralisação das atividades econômicas se torne mais branda.

O professor e conselheiro federal de economia, Lauro Chaves Neto, destaca que lideranças de instituições como Fiec, CDL, Fecomércio e Sindilojas são bastante atuantes, tanto dentro do setor como na interação com o poder público, o que coloca o Estado na frente na retomada. “Nosso ambiente de negócios vem paulatinamente melhorando, precisamos que a melhora se dê em uma velocidade mais alta, mas já temos uma série de melhorias”, analisa.

“Um estado equilibrado em termos fiscais, dívidas, tem menos dificuldade de retomar as atividades que um estado como Rio de Janeiro ou Minas Gerais”, exemplifica. Ele pontua que existem estados com situação melhor que o Ceará por terem produção industrial mais sólida, base exportadora, mercado competitivo e empresas âncoras de grande porte, mas que a economia cearense está bem colocada. “Se comparar o Ceará com outros estados de situação de renda parecida como o Maranhão, Pará e Pernambuco, estamos em uma situação mais competitiva para a retomada”, diz.