Cofecon realizou debate sobre o papel do Estado no desenvolvimento

Durante a 684ª Sessão Plenária do Cofecon foi realizado um debate sobre o papel do Estado na promoção do desenvolvimento. Os debatedores foram os economistas João Sicsú e Caetano Penna, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Sicsú foi o primeiro a falar e começou tratando de diefrentes visões econômicas sobre Estado e desenvolvimento. Caracterizou a crise iniciada em 2008 como causada por uma falta de atividade direta do Estado na regulação econômica. “As economias mais fortes e avançadas estão em depressão ou saindo dela sem perspectivas muito alvissareiras. A crise, iniciada com o subprime nos estados Unidos, se espalhou de tal forma que nós assumimos características muito semelhantes, como recessão e desemprego”.

Sicsú mencionou o balanço da reunião do G20 realizada em 2009, na qual afirmou-se que “Nossos povos tinham a preocupação de que o mundo estivesse à beira de uma depressão. (…) Não podemos descansar até que a economia global esteja totalmente recuperada”, o que caracteriza uma ação forte do Estado no combate à crise econômica. E contrastou o tom da afirmação com a reunião realizada em 2010, com a crise grega já manifesta, recomendando austeridade e sustentabilidade fiscal, evitando deixar dívidas para gerações futuras.

Ao apontar que hoje existem benefícios sociais que impedem que a economia mergulhe numa depressão como na década de 1930, Sicsú afirmou que o Brasil “entrou atrasado na crise, mas entrou. Nas grandes depressões as economias batem no fundo do poço e continuam sua vida com taxas baixas e voláteis, positivas e negativas”. Foi neste contexto que o economista falou sobre o crescimento de 1% em 2017.

Sicsú apresentou alguns gráficos caracterizando o início da crise brasileira em 2014, com ênfase em um gráfico sobre a taxa de crescimento do estoque de capital em relação ao trimestre anterior – muito baixo nos últimos trimestres. “Capitalismo não é capitalismo sem o crescimento do estoque de capital. Isso caracteriza uma depressão, além daquelas características que já falei”.

Finalmente, o economista argumentou que não é o crescimento econômico que tira um país da depressão, mas sim uma ação forte do Estado para que haja uma retomada dos investimentos. “Mas no Brasil o estado está contribuindo no sentido inverso”, concluiu ao afirmar que as desonerações são um símbolo da crise brasileira e que um total de 2,5 pontos percentuais da recessão brasileira em 2015 são decorrentes da operação Lava Jato – uma ação que, embora não seja do poder Executivo, também é promovida pelo Estado. “Temos que estimular o gasto privado, mas quem tira o país desta situação é o poder público”.

Caetano Penna começou apresentando visões diferentes sobre o mercado e o Estado, desde as ideias divulgadas na revista The Economist (os governos sempre foram péssimos em selecionar vencedores), passando por Keynes, Adam Smith, Karl Polanyi, entre outros, mostrando que a fronteira entre estado e mercado é sujeita a condições históricas, políticas, geográficas, sociais e etnográficas. “O Estado, e o Estado somos nós, e isso inclui as instituições de governo, ao definir em leis os direitos de propriedade, o fornecimento de bens públicos e condições de regulação, define a fronteira do Estado. O próprio livre mercado, para o seu bon funcionamento, requer a atuação dos órgãos estatais”.

Em seguida, abordou a teoria das falhas de mercado e tratou também das falhas de governo, falou rapidamente sobre autores desenvolvimentistas do ponto de vista dos países menos desenvolvidos e afirmou que estudos mais recentes tratam da mão visível do Estado como fundamental no processo de desenvolvimento de países. “Os países que se desenvolveram, se desenvolveram com um estado desenvolvimentista, bastante atuante na economia. Tanto os países presentemente industrializados, como os Estados Unidos, Japão, Alemanha e Inglaterra, quanto os países mais recentemente desenvolvidos, como a Coreia e os tigres asiáticos”, apontou Penna. Em seguida, mostrou gráficos para falar sobre o caso dos Estados Unidos.

O economista também falou sobre políticas públicas orientadas por missões, tais como a missão Apollo (para levar o homem à lua) ou o projeto Manhattan (domínio da energia nuclear para fabricar a bomba atômica). “Hoje em dia, a nova rodada de políticas orientadas pormissões exige que as tecnologias surgidas sejam difundidas na economia. As missões de hoje são do tipo combater mudanças climáticas, garantir segurança energética, então não se trata apenas de demonstrar a viabilidade de levar o homem à lua ou de utilizar a energia solar, e sim de que a energia solar se difunda no sistema atual”. Para cumprir estas missões, Penna afirmou que o país precisa de um Estado empreendedor, que assuma riscos e possa ter um aprendizado constante.

Ao falar sobre o sistema brasileiro de inovação, afirmou que este tem todos os elementos de um sistema de inovação bem desenvolvido. Elogiou a atuação da Embrapa e da Fiocruz e falou sobre o capital de longo prazo fornecido pelo BNDES, a presença de recursos naturais e um mercado consumidor expressivo. Como pontos negativos, falou sobre a baixa propensão a inovar, a falta de uma agenda estratégica, a ineficiência nas políticas de regulação e o fato de ser prejudicado pelas políticas da agenda macroeconômica (como a PEC do Teto ou a alta taxa de juros). “Precisamos de reformas institucionais muito importantes na área de tributação e regulação da indústria, e a reforma de tributação precisa vir acompanhada de uma discussão do pacto federativo, da reforma da Previdência e da reforma trabalhista”, argumenta.

Em suas observações finais, Penna menciona que ao contrário das economias avançadas, Brasil ainda não formulou uma estratégia nacional de manufatura avançada de grande envergadura, mas avalia que a janela de oportunidade permanece aberta. “Urge a formação de uma estratégia nacional ambiciosa, que trate das deficiências estruturais dos nossos ecossistemas de inovação e assim avance o projeto de desenvolvimento socioeconômico brasileiro”.

Após as respectivas falas, João Sicsú e Caetano Penna responderam às perguntas formuladas pelos conselheiros federais, resultando num debate rico e produtivo. Nesta mesma sessão plenária o Cofecon aprovará uma nota oficial sobre o assunto.

João Sicsú é graduado em Ciências Econômicas e doutor em Economia pela UFRJ, onde atualmente é professor do Instituto de Economia, e mestre em Economia pela Universidade Federal Fluminense. Desenvolve pesquisas nas áreas de Macroeconomia e Teoria Monetária/Financeira.

Caetano Penna é graduado em Economia pela UFRJ, mestre em Governança Tecnológica pela Universidade de Tecnologia de Tallinn (Estônia) e PhD em Política de Ciência e Tecnologia pela Universidade de Sussex (Reino Unido). É professor adjunto de Economia Industrial e da Tecnologia no Instituto de Economia da UFRJ, onde leciona no programde pós-graduação em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento. Também leciona Introdução à Economia Industrial e Empreendedorismo. É pesquisador associado da Science Policy Research Unit (SPRU da Universidade de Sussex.